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A Polícia Federal (PF) deflagrou na manhã desta quinta-feira (10) uma operação em Corumbá (MS) para investigar indivíduos suspeitos de provocarem um incêndio de grandes proporções no Pantanal, conhecido como “muralha de fogo”.
O episódio, que ocorreu em junho, ganhou notoriedade no Brasil após a divulgação de imagens das festividades do São João de Corumbá, que mostravam o incêndio ao fundo, na divisa com a Bolívia.
Foram expedidos mandados de busca e apreensão contra seis membros de uma mesma família, acusados de iniciar o incêndio em uma área pertencente à União. Um sétimo integrante da família também é alvo da investigação e se encontra preso preventivamente por outro crime. A PF apura que a família explora a região ilegalmente para a criação de gado, e uma das práticas recorrentes é atear fogo para realizar o manejo, eliminando a vegetação seca que não é consumida pelos animais e permitindo o crescimento de nova pastagem.
O incêndio teve início em 1º de junho e se espalhou, devastando uma área estimada em 6,5 mil hectares, embora estimativas do site G1 sugiram que, incluindo as queimadas no território boliviano, a área total atingida ultrapasse os 30 mil hectares. A PF relatou que o fogo manteve focos ativos, atingindo seu ápice durante as festividades de São João, nos dias 21 e 23 de junho.
Imagens de satélites identificaram queimadas em áreas de propriedade da União, em uma Área de Proteção Permanente do Rio Paraguai, e em terras devolutas, geralmente destinadas à preservação ambiental. Durante a investigação da origem do fogo, a PF encontrou indícios de outros possíveis crimes, como o uso irregular de terras da União para pecuária e contrabando de bois da Bolívia, além de ter resgatado um trabalhador em condições análogas à escravidão.
Uma denúncia anônima recebida em junho apontou que o filho de um pecuarista local, conhecido como Capim, teria sido responsável por atear fogo nas margens do Rio Paraguai. A PF descobriu que “Capim” é o apelido de Carlos Augusto Alves Martins, filho de Carlos Augusto Borges Martins, conhecido como Carlinhos Boi, considerado o único pecuarista da região. Carlinhos Boi é pai dos demais investigados: Antônio Carlos de Borges Martins (Poré), Carlos Roberto Alves Martins, Damião Alves Martins, Carlos Francisco Alves Martins e Carlos Antônio de Borges Martins.
Os sete estão sob investigação, mas os mandados de busca e apreensão não incluem Poré, que está preso preventivamente por homicídio. Entre os crimes investigados estão a provocação de incêndio florestal, redução de pessoas à condição análoga à de escravo, ocupação irregular de terras da União, falsidade ideológica documental e associação criminosa.
A investigação conta com um laudo pericial de imagens de satélite que detectou alterações na área atingida pelas chamas e o aumento da presença de rebanhos bovinos entre 2020 e 2024. O documento aponta uma grande desproporcionalidade entre o número de bovinos registrados em nome de Carlinhos Boi e a extensão de sua propriedade, indicando que áreas além dos limites de sua propriedade, registrada como Retiro Tamengo, estão sendo utilizadas, possivelmente para movimentação de gado contrabandeado da Bolívia.
Uma testemunha ouviu a polícia afirmando que os investigados atearam fogo com o objetivo de eliminar a vegetação alta, facilitando a visualização do gado e mantendo pastagens na área. Segundo as evidências, as áreas investigadas são frequentemente alvos de incêndios provocados para queimar a vegetação nativa e beneficiar o pasto do gado.
A propriedade está registrada no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Sural (Sicar) em nome de Antoninha Alves de Souza, mas o CPF associado é de Carlos Augusto Martins, o Carlinhos Boi, que já possui inquéritos policiais por crimes ambientais e por manter trabalhadores em condições análogas à escravidão. Em 2023, Carlinhos Boi foi multado em R$ 300 mil por manter um casal em condições degradantes, sem alimentação e bebendo água do rio. O caso foi investigado pela Polícia Civil com apoio da Polícia Militar Ambiental.
A investigação sobre os incêndios destaca que o ponto de ignição do fogo não ocorreu dentro da propriedade de Carlinhos Boi, mas há indícios, baseados em laudos e registros policiais, de que ele e seus filhos tenham sido os responsáveis pelo início das chamas.