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Nicolas Puech, o herdeiro octogenário da fortuna da marca de luxo Hermès, que gerou controvérsia no ano passado por seu plano de adotar e deixar sua herança para seu jardineiro, pode não ter tanto a doar, afinal. Em um desdobramento recente no mistério de longa data sobre a situação financeira de Puech, um tribunal suíço rejeitou neste mês as alegações do homem de 81 anos de que seu ex-administrador de fortuna, o consultor financeiro Eric Freymond, esteve envolvido no desaparecimento de sua fortuna.
Os advogados de Puech informaram ao tribunal que ele não possui mais os ativos em questão: cerca de seis milhões de ações, avaliadas em aproximadamente €12 bilhões (US$13 bilhões ou R$73 bilhões) na Hermès International SCA, controlada pela família. Essa participação faria dele o maior investidor individual na fornecedora de bolsas Birkin e lenços de seda coloridos, fundada em 1837.
Desde então, a empresa se expandiu, tornando-se uma das maiores no setor global de luxo, elevando a família Hermès ao status de mais rica da Europa. Segundo o Bloomberg Billionaires Index, a família, com mais de 100 membros, possui um patrimônio líquido de cerca de US$155 bilhões (R$875 bilhões).
A decisão de um tribunal de apelações em Genebra, em 12 de julho, não encontrou evidências de que Freymond tenha gerido mal a fortuna de Puech ou que o recluso herdeiro, descendente de quinta geração do empresário francês Thierry Hermès, tenha sido enganado ao longo de mais de duas décadas, período durante o qual pelo menos algumas das ações foram vendidas.
“A ‘fraude gigantesca’ da qual ele foi vítima era indetectável para mortais comuns”, afirmava o documento do tribunal, acrescentando que as alegações eram pouco claras e insuficientemente fundamentadas.
Gregoire Mangeat, advogado de Puech, recusou-se a comentar, enquanto os advogados de Freymond, Yannis Sakkas e Stephane Grodecki, disseram que seu cliente estava satisfeito com o desfecho, que incluía “palavras duras” contra o reclamante.
A decisão do tribunal suíço é parte das consequências de uma tentativa do magnata do luxo Bernard Arnault, fundador da LVMH, de assumir o controle da Hermès há mais de uma década. Ele falhou, mas Puech, que é solteiro e sem filhos, tornou-se um pária na família devido ao seu suposto papel na forma como Arnault acumulou furtivamente uma participação na empresa.
O destino da participação de aproximadamente 5,7% de Puech permanece um enigma desde o confronto, que terminou em 2014, quando Arnault começou a desfazer sua participação de 23% e Puech deixou o conselho de supervisão da Hermès.
Durante uma teleconferência sobre os resultados da empresa na última quinta-feira, um analista questionou o presidente executivo da Hermès, Axel Dumas, sobre se Puech possuía as ações. Dumas respondeu: “Não temos como vê-las e controlá-las.”
A decisão da Justiça suíça deixa a questão do paradeiro das ações sem resposta, mas oferece uma visão sobre as circunstâncias atuais de Puech. No ano passado, o residente de Orsieres, no cantão suíço de Valais, buscou cancelar seu contrato de herança com sua Fundação Isocrates após supostamente iniciar procedimentos para adotar seu jardineiro de meia-idade, a quem legaria parte de sua fortuna. A decisão deixou a instituição de caridade em limbo e adiou novas concessões.
No caso suíço, Puech alegou que sua riqueza veio quase inteiramente de suas ações na Hermès e que ele não possui mais nenhuma delas, mas não percebeu isso porque Freymond recebia todos os extratos bancários. O documento do tribunal descreve um período de 24 anos durante o qual Puech confiou a Freymond a gestão de sua fortuna.
A partir de 1998, Puech começou a transferir para bancos suíços ações da Hermès que eventualmente somariam 6 milhões. Ele deu a Freymond uma série de mandatos assinados para supervisionar suas contas. A partir de 2001, ações foram vendidas, compradas e transferidas por meio de um dos bancos.
Crucialmente, um lucro de €53,7 milhões foi registrado nas vendas de ações ao longo de quase dois anos até outubro de 2010, mesmo mês em que Arnault revelou à família Hermès que havia acumulado uma participação na empresa.
Puech não teve “objeções” à entrada do investidor externo na participação acionária da Hermès e até o considerava um “aliado”, de acordo com o tribunal. Sua família, no entanto, montou uma estratégia que conseguiu manter Arnault à distância.
Puech cancelou os mandatos de Freymond em outubro de 2022, decidiu fazer um balanço de sua riqueza e organizar sua sucessão, segundo a decisão do tribunal suíço. Um ano depois, ele entrou com três processos contra Freymond, alegando que o gestor de fortunas reteve informações e não devolveu e nem poderia devolver as ações da Hermès. Os outros estavam relacionados à gestão de sua fundação, empréstimos e outros investimentos.
A decisão do tribunal concluiu que Puech voluntariamente entregou a gestão de seus assuntos a Freymond, inclusive assinando numerosos documentos em branco e dando acesso às suas contas bancárias. Puech nunca disse que foi enganado ou que não entendia o que estava assinando, apenas que deixava as escolhas sobre o crescimento de sua riqueza para Freymond. Ele poderia ter revogado o acordo a qualquer momento, disse o tribunal.
“Não está claro quem impediu o reclamante de se interessar por como seus ativos estavam evoluindo”, concluiu o tribunal, acrescentando que a “confiança cega” de Puech em Freymond não é uma indicação da desonestidade do gestor de fortunas.