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A Polícia Civil de Minas Gerais (PC-MG) indiciou nesta terça-feira (09), 11 funcionários da cervejaria Backer após a intoxicação por dietilenoglicol em cervejas da marca. Entre os crimes listados, estão lesão corporal, contaminação de produto alimentício e homicídio.
De acordo com o delegado Flávio Grossi, a Polícia conseguiu comprovar, física e quimicamente, a existência de um vazamento no tanque de cerveja. As investigações comprovaram que o vazamento começou em setembro de 2019, quando foi adquirido o tanque JB10, que foi onde a polícia concentrou seus esforços, por ter demonstrado quimicamente alta concentração da substância:
“Encontramos o vazamento dentro do tanque. O líquido ia para dentro da cerveja. Achamos a comprovação física e visual da existência desse vazamento, mas, para nossa equipe, queríamos mais. Demonstramos quimicamente uma similaridade entre o produto retirado no tanque e lá dentro do produto. Tinha a mesma composição. Comprovamos de forma química a existência desse vazamento”.
Grossi disse também que foram encontrados outros pontos de vazamento na mesma adega. Um deles, na bomba do chiller, o resfriador dos líquidos: “A bomba do chiller vazando, o líquido se espalhava pela fábrica”.
Fazem parte do grupo de indiciados:
- Testemunha que mentiu em seu depoimento (responderá por falso testemunho e obstrução)
- Chefe da manutenção (responderá por homicídio culposo, lesão corporal culposa e contaminação de produto alimentício culposa)
- Seis pessoas do grupo gestor e responsáveis técnicos (responderão por homicídio culposo, lesão corporal culposa e contaminação de produto alimentício dolosa)
- Três pessoas do grupo societário (responderão de forma dolosa por não dar publicidade a produto que causa risco e por manter em depósito e colocar à venda esse produto)
“Esta investigação foi multifacetada, tivemos químicos, engenheiros, peritos da maior gama possível. Atuamos de forma extremamente centrada e, para iniciar a investigação, precisávamos entender como é feita a cerveja”, afirmou o delegado.
De acordo com a Polícia Civil, o inquérito, que chegou a considerar 42 vítimas, foi concluído com 29 vítimas criminais. Sete morreram e 22 sobreviveram.
“No decorrer das investigações, retiramos dez vítimas por fatores investigativos ou médicos. Ou laudo descartava ou deixava em dúvida. Três vítimas não desejaram fazer testes de exames”, explicou Grossi.
Ele também esclarece que outros 30 casos ainda serão analisados. Segundo o delegado, se essas eventuais vítimas fossem anexadas às investigações neste momento, a solução do inquérito poderia ser adiada.
“Essas pessoas não serão abandonadas”, afirmou.
Uso de produtos tóxicos
De acordo com o delegado, em nenhum momento, os técnicos da cervejaria atuaram com dolo. “Foi um fato acidental, sem sombra de dúvida, mas passível de punição”, afirmou. Segundo ele, foram identificadas duas modalidades da culpa: negligência e imperícia.
Ele frisou que duas condutas levaram às intoxicações e mortes: o uso incorreto do equipamento, com substância tóxica, e o descontrole (vazamento) dessa substância. “Se tivessem interrompido qualquer uma dessas duas condutas, nada disso aconteceria”, disse o delegado.
“O tanque exigia consumo de substância não tóxica e era usada substância tóxica. Chiller indicava também uso de substância não tóxica. Essas substâncias (não tóxicas) poderiam circular e, mesmo vazando, não haveria efeito danoso às vítimas. Não causariam nenhuma letalidade ou lesão às vítimas. Se os manuais dos fabricantes fossem seguidos, não estaríamos aqui. No máximo ocorreria diferença de sabor ou aumento de teor alcoólico. Se o álcool tivesse sido usado (em vez de dietilenoglicol), nós não estaríamos aqui hoje”, disse Grossi.
O superintendente de Polícia Técnico-Científica, Thales Bittencourt, explicou que tanto o monoetilenoglicol quanto o dietilenoglicol são tóxicos e causam a síndrome nefroneural, com pequena diferença nos sintomas.
Mas as necropsias feitas em vítimas que perderam a vida constataram que a contaminação foi por dietilenoglicol:
“Em todas elas foram constatadas alterações macro e microscópicas compatíveis com contaminação por dietilenoglicol. E em todas também foi constatada a presença do tóxico dietilenoglicol. Cem por cento de produtividade nas necropsias”, afirmou.
A forma como esse produto tóxico era adquirida pela Backer será alvo de uma segunda investigação, mas, segundo o delegado Flávio Grossi, ela não interfere na conclusão deste inquérito, que já constatou que o dietilenoglicol foi usado indevidamente e que houve vazamento dele para as cervejas que depois foram consumidas pelas vítimas.
Conforme os delegados, os laudos de todas as perícias feitas ao longo das investigações já foram entregues à Justiça, e agora o Ministério Público vai analisar as medidas que julgar cabíveis.
A Backer informou que “reafirma que irá honrar com todas as suas responsabilidades junto à Justiça, às vítimas e aos consumidores. Sobre o inquérito policial, tão logo os advogados analisarem o relatório, a empresa se posicionará publicamente”.