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RFI – Multiplicam-se as manifestações de torcedores argentinos em meio a um país em luto. O corpo de Diego Maradona passa pela autópsia antes do velório na Casa Rosada, sede do governo, na capital argentina. O presidente Alberto Fernández suspendeu todas as atividades até sexta-feira (27). O clube Boca Juniors, onde centenas se reúnem, conseguiu suspender o jogo desta quarta-feira (35) pela Taça Libertadores da América.
Somente às 17h15 (hora local), a primeira voz oficial confirmou a morte de Maradona. O promotor geral da Argentina, John Broyad, confirmou aquilo que todo o país sabia, mas não queria ouvir:
“Infelizmente, podemos confirmar o falecimento de Diego Armando Maradona aproximadamente às 12h. Às 16h, começou o trabalho da Polícia científica. A partir das 18h, começará a autópsia para determinar as causas da morte, mas não se percebeu nenhum sinal de criminalidade, de violência. O falecimento possui características naturais”, anunciou Broyad no meio de um tumultuado enxame de jornalistas em frente à casa onde Maradona faleceu.
O promotor deu o seu próprio drible. Enquanto falava, o corpo saía da casa cercado de patrulhas da Polícia rumo ao necrotério de San Fernando, município vizinho ao Tigre, onde Maradona estava desde o dia 11 de novembro, depois de ter recebido alta da clínica onde foi operado, no dia 3, de um hematoma subdural.
O corpo em caravana policial foi acompanhado como uma procissão transmitida a todo o país. Assim como o drible do promotor não evitou a cobertura da imprensa, Maradona não conseguiu dar o seu último drible na morte.
Segundo o boletim policial, ele acordou de manhã, mas voltou a dormir por não se sentir bem. Quando lhe foram dar um medicamento aparentava continuar dormindo, mas já não acordaria mais.
Ao constatarem que não reagia, um médico vizinho foi chamado para ajudar. Enquanto lhe praticavam reanimação cardiopulmonar (RCP), um serviço médico privado foi chamado. As tentativas de reanimação duraram 30 minutos até as 11h45. Ao meio-dia, a polícia foi avisada.
Na Argentina, o silêncio de incredulidade tornou-se espesso pelo luto. O país vive uma espécie de feriado forçado de tristeza. Na Vila Fiorito, a favela na periferia de Buenos Aires, onde Maradona viveu, os moradores foram até a casa dos Maradona e, espontaneamente, pintaram a fachada abandonada.
Os torcedores ocupam espaços emblemáticos da carreira do jogador. Na porta do clube Gimnasia y Esgrima de La Plata, a 56 Km de Buenos Aires, último clube do qual Maradona foi técnico. Na porta do Clube Atlético Newell’s Old Boys, em Rosário, província de Santa Fé, na porta do seu clube de coração, o Boca Juniors, ou onde tudo começou, o Argentinos Jrs, no bairro de La Paternal em Buenos Aires. Em todos, faixas, cartazes, flores e velas em homenagem.
“Eu estive neste estádio, quando ele estreou em 20 de outubro de 1976. Foi a melhor fase do futebol dele. Fez coisas incríveis aqui. Era um gigante. Sem ele, o futebol morreu. É o que sinto. O futebol morreu. Não houve, não há e não acredito que haverá alguém que o supere”, diz emocionado Claudio, 72.
“Venho render homenagem porque aqui foram os seus primeiros dribles. Foi onde a mágica começou. Este é o lugar que mais o representa na essência. Não acreditei quando soube. Não pude evitar chorar. Foi o argentino que mais alegrias nos deu na vida. Pensamos que o mito é imortal. Mas hoje o mito torna-se lenda”, afirma Alberto, 55.
No Boca Juniors, o clima era o mesmo. Foi aqui que Maradona projetou-se ao mundo e onde ocupava o camarote como um torcedor. “Aqui era o Diego do povo. Por mais que algum jogue parecido e queira destroná-lo, nunca haverá outro Maradona. Maradona não morrerá nunca. Nasce a lenda”, acredita Juan Pablo, 32.
“Pensei que fosse uma mentira quando recebi uma mensagem. Depois, pensei que, se fosse verdade, ele poderia sair como num drible, como sempre fez. Desta vez, ele não conseguiu driblar. Estou destruída”, disse entre lágrimas Patricia, 46.
Velório de Maradona
O velório de Maradona não será em nenhum dos clubes. Será na Casa Rosada, sede do governo. Pelos proximos três dias, o presidente Alberto Fernández suspendeu toda a agenda oficial. Maradona tornou-se questão de Estado.
“Estou recebendo mensagens de autoridades do mundo. O chanceler do México, o presidente de Espanha. Todos me dão as condolências. Nunca vamos poder pagar tanta alegria que Maradona nos deu. São essas mortes que não podem ser preenchidas com nada. Não sei se alguma vez, poderemos ter outro Diego. Eu duvido”, avaliou o presidente Alberto Fernández.
“Tenho uma dor profunda que não posso explicar. Estou destruído. Não consigo acreditar. Foi uma parte da minha vida. Era parte das vidas de todos os argentinos”, disse comovido César Luis Menotti, ex-treinador, campeão em 1978.
A Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), por pressão do clube Boca Juniors, suspendeu o joga desta noite entre o Boca e o Internacional pela Taça Libertadores da América em Porto Alegre. A Conmebol pretendia fazer uma homenagem, mas os jogadores argentinos avisaram que não entrariam em campo. O jogo será dentro de uma semana.
“O clube agradece o respeito da Conmebol”, agradeu, em nota, o Boca. “O legado de Maradona será transmitido de geração em geração até a eternidade. O Boca decreta três dias de luto e suspende todas as atividades”, anunciou o clube num espelho do que se tornou a Argentina, paralisada pela morte do seu mais famoso filho.
“Diego está dentro da galeria dos mitos da Argentina. Nessa galeria estão Ernesto ‘Che’ Guevara, Evita, Carlos Gardel, Juan Domingo Perón e Juan Manuel Fangio. Sobre todos eles, havia devoção em vida, mas o mito veio com a morte. Maradona era um mito vivo”, disse à RFI Daniel Arcucci, autor do livro “El Diego de la gente”(“O Diego do povo”).