Brasil

É esperto esse João

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro ocupa permanentemente os noticiários desde sua posse, quase que invariavelmente envolvido em polêmicas, em frequentes atritos com as mais diversas personagens do mundo político – do Brasil e, mais recentemente, do exterior -, expondo-se a toda sorte de desgastes – alguns, francamente desnecessários -, em constante conflito com a imprensa e comunicando-se muitas vezes através de desastradas declarações sem qualquer filtro, uma outra figura da política nacional vai trilhando o caminho inverso:

o governador João Doria, habilmente, vai se aproveitando das brechas nos noticiários para construir para si uma imagem pessoal oposta à do presidente.

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Diariamente, Doria alimenta a imprensa e suas redes sociais exclusivamente com uma agenda positiva, esgueirando-se de controvérsias; e, ao mesmo tempo em que trabalha para se descolar do bolsonarismo, está sempre atento aos movimentos erráticos do presidente e de seu núcleo mais próximo – e, sem fazer muito alarde, vai ocupando os espaços que nota terem ficado vazios.

Os frequentes elogios públicos a Sergio Moro, por exemplo, não são aleatórios: ele percebe o desprestígio ao qual o ministro tem sido exposto pelo presidente e faz o movimento oposto. No final de Junho, em meio às divulgações das conversas roubadas por hackers e divulgadas por um site esquerdista, Doria – ao contrário de Bolsonaro que pouco se envolveu na defesa de seu ministro – condecorou Moro com a mais alta honraria do governo paulista.

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Doria sabe que Sergio Moro & A Lava Jato – no imaginário popular ainda é tudo a mesma coisa e por muito tempo será assim – são maiores do que qualquer partido e do que qualquer político – maiores, inclusive, do que Bolsonaro.

Seus movimentos são todos claramente calculados.

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Perguntado a respeito de um possível convite ao ministro para que dispute sua sucessão ao governo do Estado de São Paulo, Doria evidentemente negou; mas a resposta, no caso, pouco importa: o que importa é a pergunta – e em como ela chegou aos repórteres que a dirigiram ao governador: não é difícil supor que o próprio Doria lance balões de ensaio dessa natureza.

Perguntado ainda se gostaria de ter Moro integrando o governo de São Paulo, limitou-se a responder com outra pergunta:

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Quem não gostaria?

É como se avisasse: se o Bolsonaro soltar, eu pego – e o transformo, no dia seguinte, no super secretário de segurança pública do Estado de São Paulo.

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Zeloso na tarefa de manter proximidade com os setores do governo federal que gozam de relevância e prestígio, também é todo amores com Paulo Guedes, a quem classifica como “bom e querido amigo de mais de 30 anos”.

Paulo Guedes é garantia para o Brasil de um governo liberal que acredita na livre iniciativa, que o Estado deve ser menor e tem a convicção de que devemos ter menos Brasília e mais Brasil — disse Doria, em evento realizado na última segunda-feira, repetindo um dos bordões preferidos do ministro.

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Registre-se também que na Assembleia Legislativa de São Paulo, Doria manobrou para diminuir os espaços da bancada do PSL, formada em grande parte por deputados de primeiro mandato e apoiadores do presidente: para isso, não se constrangeu em ver o PSDB se aliando ao PT para garantir a presidência da casa, frustrando as pretensões de Janaína Paschoal.

Sempre atento em ser o contraponto ao presidente, recebeu em audiência, no final do mês passado, o chanceler francês Jean-Yves Le Drian – um dia após o mesmo ter uma reunião cancelada com Bolsonaro, que alegou problemas de agenda e apareceu horas depois em uma live na internet, cortando o cabelo.

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Em outra vitória desse jogo de xadrez, vê a tentativa de se levar para o Rio de Janeiro o Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1 cada vez mais distante: a ideia, sabe-se lá porque razões, encampada pelo presidente Bolsonaro, depende da construção de um autódromo – em uma cidade já às voltas com os elefantes brancos deixados pelos recentes Jogos Olímpicos – e tem sofrido seguidas derrotas na justiça. Doria assegurou que o evento não sairia de São Paulo e, ao que tudo indica, isso se confirmará.

O caminho que pode – ou não – transformar o governador de São Paulo em candidato viável à sucessão presidencial em 2022 ainda é muito longo e qualquer tipo de “prognóstico” a respeito neste momento seria completamente descabido – mas é certo que, caso queira ser presidente, Doria terá que enfrentar muitas tarefas espinhosas. A primeira é ter o controle do seu próprio partido em nível nacional, o que está muito distante de acontecer. Outro objetivo é a “purificação” da agremiação, cujo primeiríssimo passo é a expulsão de Aécio Neves – e após uma tentativa frustrada há poucos dias, um recurso apresentado pelo PSDB paulista ao diretório nacional pede mais uma vez a análise do caso.

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Doria precisará vencer ainda a resistência de uma enorme parcela dos paulistas: é necessário lembrar que ele se elegeu por uma margem mínima, colando na testa de seu adversário o rótulo de “esquerdista” e surfando na efêmera onda batizada de “bolsodoria”. Muito mal visto pelos eleitores da capital – que não perdoam o fato dele ter jurado que exerceria na totalidade o mandato de prefeito, para abandonar o cargo após quinze meses -, precisa responder com uma gestão convincente à frente do governo estadual, com menos marketing pessoal e mais realizações.

Apesar disso, não deixa de ser merecedora de atenção a sua atuação política. Ao contrário do que demonstraram muitos tucanos nos últimos anos, Doria saber ler o momento, as tendências, o que dizem as ruas, as redes sociais. Jamais cometeria o erro estúpido de Geraldo Alckmin que, diante do enfrentamento com um candidato declaradamente de direita, cujo discurso seduzia uma enorme parcela do eleitorado, tentou se colocar como oponente ideológico, abraçando discursos da esquerda – para, ao final, não ter votos nem da direita, muito menos da esquerda, naquela que já entrou para a história como uma das mais acachapantes derrotas eleitorais já vistas por aqui, por absoluta falta de visão estratégica.

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Enfim, o sujeito que entrou na política dizendo não ser político, em menos de três anos demonstrou exatamente o contrário: o “gestor” que ele tanto propagandeava, ainda precisa se consolidar; mas o político – o meticuloso, calculista e hábil político – nós já conhecemos bem.

 

 

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