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Nos últimos dias, temperaturas superficiais em partes da Antártida aumentaram quase 30ºC acima do normal. Apesar do frio característico da região, os cientistas estão chamando o fenômeno de “onda de calor” antártica, um evento raro e prolongado que ocorre pela segunda vez em dois anos e gera preocupações quanto às mudanças climáticas. Esse evento extraordinário de aquecimento na Antártida pode impactar o Brasil.
Em entrevista ao jornal Washington Post, Edward Blanchard, cientista atmosférico da Universidade de Washington, descreveu a situação como um evento quase recorde para a região da Antártida onde tem o maior impacto.
Ele destacou que o fenômeno atinge uma grande parte da Antártida Oriental, a maior parte do continente.
A “onda de calor” polar ocorre no meio do inverno antártico, quando as temperaturas na região geralmente ficam em média em torno de -20ºC, podendo atingir até -70ºC ou -80ºC em algumas estações. No entanto, as temperaturas recentes têm registrado anomalias de 20ºC a 30ºC acima do normal. Para contextualizar, uma anomalia de 30ºC seria equivalente a Porto Alegre registrar 60ºC em uma tarde de janeiro, quando a temperatura média máxima é de 31ºC e o recorde histórico é de 40,7ºC.
Enquanto grande parte do continente experimentou calor excepcional, uma onda de frio trouxe temperaturas extremas para parte da Antártida em julho. No dia 17, as estações meteorológicas em Dome Fuji registraram -82,1ºC, a segunda temperatura mais baixa já registrada em julho.
O inverno antártico é caracterizado por flutuações extremas de temperatura devido à falta de luz solar. No entanto, essa “onda de calor” é um desvio muito maior do que o normal. Embora as causas não sejam totalmente compreendidas, os cientistas acreditam que o fenômeno pode estar relacionado a eventos na estratosfera, cerca de 30 quilômetros acima da superfície. O vórtice polar, uma faixa de ar frio e baixa pressão que gira ao redor de cada polo, geralmente é forte e estável durante o inverno no Hemisfério Sul. No entanto, ondas atmosféricas enfraqueceram o vórtice, levando a um evento conhecido como Aquecimento Estratosférico Repentino.
Dados mostram que esse evento de aquecimento estratosférico também está afetando a atmosfera inferior. O enfraquecimento do cinturão de ventos de oeste ao redor da Antártida, conhecido como corrente de jato, e a perturbação do vórtice polar, que agora possui dois centros de circulação, permitiram que o ar frio normalmente confinado ao Polo Sul se deslocasse para o norte em direção à Nova Zelândia, sul da África e sul da América do Sul, como se a porta de uma geladeira tivesse sido deixada aberta. Como resultado, as temperaturas aumentaram drasticamente perto do Polo Sul.
O enfraquecimento do cinturão de ventos ao redor da Antártida é identificado pela Oscilação Antártica, uma variável importante para a MetSul Meteorologia, pois influencia chuvas, massas de ar frio e a formação de ciclones no Atlântico Sul. A Oscilação Antártica (AAO) ou Modelo Anular Sul é uma das variáveis mais importantes que afetam as condições no Brasil e no Hemisfério Sul. Os valores da AAO neste início de agosto apresentam desvios sigma de até -4 a -5, muito abaixo do normal.
A Oscilação Antártica é um índice de variabilidade relacionado ao cinturão de ventos e às baixas pressões ao redor da Antártida, com duas fases: positiva e negativa. Na fase positiva, o cinturão de ventos se intensifica e se contrai ao redor do Polo Sul, enquanto na fase negativa ele enfraquece e se desloca para o norte, em direção ao Equador, mas sem atingi-lo.
A fase negativa da Oscilação Antártica aumenta as chances de episódios de chuva intensa e ciclones. Estudos mostram que, mesmo com as condições no Pacífico (El Niño, neutralidade ou La Niña), a fase negativa da AAO está associada a uma maior frequência de precipitação no Sul e Sudeste do Brasil e ao ingresso de massas de ar frio polar durante o inverno.
Com a Oscilação Antártica atipicamente negativa e os ventos ao redor da Antártida enfraquecidos, há uma abertura para o escape de ar frio para as latitudes médias da América do Sul, sul da África, Austrália e Oceania. Modelos numéricos já indicam uma incursão de ar gelado nas latitudes médias da América do Sul no final desta semana, trazendo muito frio para o sul do Brasil. Há também a possibilidade de um segundo pulso de ar frio no início da semana seguinte. Com o avanço do ar frio polar para o norte, uma frente fria poderá se deslocar mais para o território brasileiro, trazendo chuva para áreas do Centro-Oeste e Sudeste, especialmente nos estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo.