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O cumprimento da pena privativa de liberdade está subordinado ao trânsito em julgado, uma imposição que deve ser respeitada não apenas nas sentenças condenatórias, mas também nos acordos de delação premiada. Essa foi a posição expressa pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que manteve a decisão de Gilmar Mendes ao barrar um trecho de um acordo de delação que previa a prisão imediata de um ex-executivo da CCR Rodonorte, caso não houvesse uma sentença condenatória prévia.
O acordo, firmado com o Ministério Público Federal e homologado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), estabelecia o cumprimento da pena de 15 anos “imediatamente após a homologação do acordo”. Entretanto, em maio do ano passado, a Corte Especial do STJ, por 7 votos a 6, decidiu que a execução imediata prevista no acordo era válida. Contudo, a 2ª Turma do STF anulou essa decisão.
Gilmar Mendes argumentou que a proposta de colaboração deve estar subordinada à sentença penal condenatória. Assim, sem uma condenação transitada em julgado, não se pode prever uma pena imediata em um acordo de colaboração. O ministro destacou que a eficácia da proposta de colaboração premiada homologada pela autoridade judiciária depende da sentença penal condenatória, e que não há base legal para que os efeitos que pressupõem o trânsito em julgado possam ser dispostos antecipadamente durante a homologação do acordo.
O decano do STF recordou que, em 2019, nos julgamentos das Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54, o Supremo já havia decidido que a pena privativa de liberdade só pode começar a ser cumprida após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Ele reiterou que essa diretriz também deve ser aplicada nos casos de colaboração premiada.
Além disso, Gilmar Mendes enfatizou que a persecução penal não se encerra na celebração do acordo, e que a antecipação dos efeitos da sentença por meio de ato negocial não é prevista pela legislação ou pela Constituição. O acordo de colaboração não serve, por si só, como um título executivo adequado para a imposição de pena privativa de liberdade, cujo cumprimento só é legítimo após um juízo definitivo de culpabilidade, formalizado em um título judicial condenatório transitado em julgado.
Em novembro de 2023, o STJ havia validado a execução imediata da pena, com o relator, ministro Raul Araújo, argumentando que essa execução era possível, pois se tratava de uma mera condição do acordo com o qual o colaborador concordou. Formaram a maioria com ele os ministros Herman Benjamin, Og Fernandes, Isabel Gallotti, João Otávio de Noronha, Ricardo Villas Bôas Cueva e Sérgio Kukina.
A divergência foi iniciada pelo ministro Mauro Campbell, que defendeu a necessidade de aguardar o trânsito em julgado da ação penal para o cumprimento da pena. Os ministros Nancy Andrighi, Humberto Martins, Luis Felipe Salomão, Benedito Gonçalves e Antonio Carlos Ferreira votaram com Campbell. Raul Araújo, por sua vez, argumentou que o tema não deve ser abordado sob a perspectiva do Direito Penal clássico, pois envolve um novo modelo de Justiça penal negocial, ao qual se insere o acordo de colaboração premiada.