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RFI – O presidente argentino, Alberto Fernández, decide como enfrentar o vácuo de poder provocado por renúncias em massa ordenadas pela sua vice, Cristina Kirchner, que exige uma reforma ministerial. A crise institucional na cúpula do poder da Argentina tem um final incerto, que ameaça a governabilidade do país.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Após 11 demissões de ministros, presidentes de empresas estatais e diretores de organismos públicos, o presidente Alberto Fernández recebeu o apoio dos ministros que não renunciaram, de governadores provinciais e de sindicalistas. Os respaldos visam preencher o vácuo de poder provocado pela disputa com a sua própria vice, Cristina Kirchner.
“Todo meu apoio a Alberto Fernández”, disse a ministra da Segurança Pública, Sabina Frederic. “Meu total e incondicional apoio ao presidente Alberto Fernández”, declarou o ministro do Transporte, Claudio Moroni.
Diversas organizações sociais devem manifestar nesta quinta-feira (16) para demonstrar apoio ao presidente, mas a fratura no comando do país já está exposta.
A tensão é provocada pela vice-presidente, Cristina Kirchner, que exige mudanças de ministros, a começar pelo chefe do gabinete, Santiago Cafiero. A vice-presidente considera que só alterações significativas podem permitir ao governo dar um sinal de mudança que reverta a dura derrota eleitoral nas eleições primárias de domingo (12). Para o Presidente, as mudanças só deveriam vir depois das eleições legislativas de 14 de novembro.
Para pressionar, a vice-presidente deu ordens de renúncias em massa. Um a um, seis ministros (Interior, Justiça, Meio-ambiente, Ciência e Tecnologia, Cultura e Desenvolvimento Territorial) e cinco secretários de Estado, presidentes de empresas e diretores de instituições públicas pediram demissão dos seus cargos, abrindo uma crise institucional cujo desenlace incerto ameaça a governabilidade do país.
“O presidente não pode resistir a uma mudança ministerial depois de uma derrota tão contundente. Seria um risco não mudar ninguém. Porém, se mudar agora vai demonstrar fraqueza e ceder poder à Cristina Kirchner. Se não mudar ninguém, vai fraturar de vez a relação com a sua vice”, observa o analista político Rosendo Fraga.
Vácuo de poder
A primeira renúncia chegou por carta divulgada simultaneamente ao presidente e à imprensa. “Escutando as suas palavras de domingo à noite, quando expôs a necessidade de interpretar o veredito (das urnas), considerei que a melhor maneira de colaborar com essa tarefa é pôr a minha renúncia à sua disposição”, escreveu o ministro do Interior, Eduardo de Pedro, numa carta dirigida a Alberto Fernández.
Apesar de vice, Cristina Kirchner é a sócia majoritária na coligação governista e quem detém o poder real dentro do governo.
“Uma vice-presidente que provoca um vácuo no poder tenta dar um golpe de Estado”, denunciou Elisa Carrió, uma das líderes da oposição, que pede ao presidente que “resista para evitar um golpe e a radicalização pretendida por Cristina Kirchner”.
“Com a ordem de renúncias, Cristina Kirchner está dando um ultimato ao presidente para mudar a equipe de governo como uma resposta às urnas. Ela quer impor os seus referentes a cargo do governo e incidir ainda mais no comando”, interpreta o analista político Lucas Romero, diretor da consultora Synopsis.
Pressão das urnas
No domingo (12), o governo sofreu uma dura derrota nas eleições primárias legislativas que tende a ser irreversível. Na prática, a magnitude da derrota enterra o objetivo governista de controlar o Congresso e se traduz em uma reprovação da gestão do presidente Alberto Fernández, na metade do seu mandato.
“Estas eleições na metade do mandato são comparáveis a um plebiscito sobre a gestão do presidente Alberto Fernández e o resultado indica que a maioria da população reprova o governo. Enfraquecido nas urnas, o presidente não tem mais condições de resistir e está perante uma crise institucional de proporções ainda desconhecidas”, avalia Romero.
As eleições primárias na Argentina são uma das poucas no mundo abertas e obrigatórias a toda a população. O voto vai àquele a quem o eleitor gostaria de ver como candidato, mas, ao fazê-lo, o eleitor revela em quem votará nas eleições gerais em 14 de novembro.
Medidas econômicas
Como resposta à derrota, o presidente prefere medidas econômicas para recuperar o poder aquisitivo. O governo prepara uma bateria de medidas para injetar dinheiro na economia através de aumento no salário mínimo, nas aposentadorias e nos planos de assistência social.
Porém, devido à falta de recursos financeiros, o dinheiro viria de mais emissão monetária sem respaldo financeiro, alimentando uma inflação anual que acumula 51,4%, um dos motivos para a derrota eleitoral de domingo.
“São todas medidas populistas para um Estado sem dinheiro. O custo virá depois das eleições de novembro. Até ontem a pergunta era: como a economia chegaria até novembro? Com esta crise institucional, a pergunta agora é: como farão para governar mais dois anos? A situação econômica é extremamente delicada”, questiona o economista Roberto Cachanosky.