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Com mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo sofrendo desta condição neurológica, o diagnóstico precoce e uma abordagem que considere tanto os sintomas físicos quanto os psiquiátricos são fundamentais para garantir uma boa qualidade de vida.
A epilepsia tem sido uma companheira da humanidade ao longo de sua história. A percepção e compreensão dos afetados por essa condição na antiguidade ilustram, de uma perspectiva, a história dos medos e do estigma em relação ao desconhecido.
De certa forma, a falta de compreensão, o desconhecimento e os medos que ela gera persistem, embora de forma menos pronunciada nos dias atuais.
O termo “epilepsia” vem do latim “epilepsĭa” e do grego “επιληψία” (epilēpsía), indicando a característica imprevisível da doença, significando “ataque”. A raiz grega “epilambaneim” é ainda mais específica, significando “pegar de surpresa”.
Esse caráter súbito e imprevisível gerou respostas emocionais diversas nos outros, mas especialmente naqueles que a vivenciam.
A epilepsia impactou figuras históricas como Júlio César; artistas como Van Gogh, entre outros; e escritores e pensadores como Fyodor Dostoyevski. Este último, de alguma forma, nos faz adentrar de maneira mais humana e com uma descrição magistral no desconforto psíquico profundo dessa patologia.
Em uma de suas obras, “O Idiota”, o protagonista, o príncipe Myshkin, sofre episódios complexos de epilepsia. Alguns afirmam que esses eram os relatos mais próximos dos que Dostoyevski teria vivido na vida real. Além das manifestações motoras convulsivas, o personagem (Dostoyevski) apresentava uma variedade de elementos de natureza neuropsiquiátrica, mas não exclusivamente motora. Estudos sugerem que ele poderia ter sofrido do Síndrome de Gastaut–Geschwind (Epilepsia na vida e na ficção de Dostoyevski).
Ele também ilustra o uso da epilepsia e a tentativa de confusão diagnóstica, quando, em “Os Irmãos Karamazov” (1880), o vilão Smerdyakov usou supostas convulsões não epilépticas de suposto origem psicogênica para justificar o parricídio cometido.
Em resumo, embora a epilepsia seja conhecida por seus aspectos visíveis e motores, ela apresenta uma constelação de sintomas psiquiátricos, bem como outros comórbidos, e afeta a saúde mental, especialmente em casos diagnosticados tardiamente ou com tratamento inadequado.
**O ABC da Epilepsia**
É necessário esclarecer que a epilepsia é um distúrbio neurológico caracterizado pela resposta a uma atividade elétrica anormal no cérebro, podendo afetar diferentes áreas corticais.
A corte cerebral, a camada mais externa do cérebro, divide-se em quatro lóbulos: frontal, parietal, temporal e occipital. Cada lóbulo possui funções específicas e pode ser afetado de diferentes maneiras pela epilepsia.
Por exemplo, o lóbulo temporal e as conhecidas epilepsias temporais podem causar sensações estranhas, como odores ou sabores, e provocar uma sensação de “déjà vu”. As convulsões do lóbulo frontal podem afetar a capacidade de fala ou compreensão da linguagem. As do lóbulo parietal podem causar sensações anormais na pele, como formigamento ou dormência, afetando a percepção espacial. Convulsões do lóbulo occipital podem causar problemas de visão, como luzes intermitentes ou manchas cegas.
Em resumo, os sintomas associados dependem da localização da atividade elétrica anormal no cérebro, e, em muitos casos, os fenômenos prodrômicos (anteriores à manifestação principal) podem envolver comprometimento da consciência ou sensações estranhas, mas não convulsões motoras.
**Quais são as dimensões comportamentais e cognitivas mais comuns da epilepsia?**
**Ansiedade:** Pode fazer parte do quadro devido a uma relação neurológica direta, como a afetação em certas áreas temporais ou frontais, ou como resposta ao diagnóstico de epilepsia, às dificuldades e medos decorrentes dos diversos sintomas ou à preocupação com a medicação. Também pode ser um efeito colateral de certos medicamentos antiepilépticos, e, especialmente nas fases iniciais, o medo de experimentar um novo episódio.
**Depressão:** Muito comum, afetando tanto crianças quanto adultos. Os sintomas podem incluir distúrbios do sono, alterações nos ritmos alimentares com mudanças na alimentação, perda de interesse em atividades usuais ou sentimentos de tristeza, raiva ou medo em relação à patologia, à sua evolução ou à medicação. Isso é causado não apenas pela lesão cerebral em si, mas por complicações secundárias, seja pela própria lesão ou pela medicação, incluindo efeitos hormonais ou ação específica de alguns antiepilépticos. A administração incorreta do medicamento também pode causar alterações de humor, entre outras.
A abordagem, antes de adicionar outro medicamento, deve equilibrar o que está sendo recebido e avaliar a necessidade de ajustes com algum antidepressivo, desde que não entre em conflito com a medicação principal. Ao mesmo tempo, a psicoterapia focada em aspectos específicos pode permitir um melhor gerenciamento desses aspectos, que podem dificultar a aceitação e o seguimento da medicação.
**Alterações cognitivas:** Em alguns casos, indivíduos relatam dificuldades de concentração, lapsos de memória e estados que descrevem como dissociação ou névoa mental. É crucial distinguir se há comprometimento no lóbulo temporal, pois as convulsões originadas nessa região podem afetar especificamente a memória a curto prazo.
A demência também é uma preocupação em certos casos de epilepsia, levando a quadros orgânicos mais graves. Um acompanhamento cuidadoso e diagnóstico diferencial são essenciais para avaliar o declínio cognitivo e sua evolução. Estudos complementares de imagens, como ressonância ou tomografia cerebral, são procedimentos rigorosos nesse contexto.
Os problemas comportamentais surgem em alguns pacientes, incluindo distúrbios comportamentais e impulsividade. Esses comportamentos podem ter origens diversas, desde causas orgânicas diretas até fatores psicológicos, e podem ser agravados pelo uso de medicamentos, formando uma complexa combinação de desafios.
Não podemos esquecer que a epilepsia está associada a lesões cerebrais, podendo ocorrer desde o nascimento ou ser adquirida ao longo da vida, seja por causas vasculares ou traumáticas. Em certos casos, a epilepsia pode resultar em deficiência intelectual, criando um espectro de alterações cognitivas que variam em gravidade.
É crucial reconhecer que os casos graves mencionados estão relacionados à natureza do diagnóstico e à evolução específica de cada paciente. Além disso, é importante compreender que a epilepsia é uma condição amplamente abrangente, com diversas variedades e níveis de afetação.
Apesar dos desafios, a vida de pacientes com epilepsia bem diagnosticada e tratada distancia-se dos estigmas e temores históricos. Em muitos casos, os resultados possibilitam uma vida totalmente normal, destacando a importância de uma abordagem integrada e especializada.
*O Dr. Enrique De Rosa Alabaster, especialista em saúde mental, é médico psiquiatra, neurólogo, sexólogo e médico legista.*