O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou nesta semana uma resolução que veda ao médico a realização da chamada assistolia fetal para interrupção de gravidez (no caso de aborto previsto em lei e oriundo de estupro) quando houver possibilidade de sobrevida do feto.
A decisão do CFM foi tomada em sessão plenária no fim de março. De acordo com a definição do CFM, o ato médico da assistolia provoca a morte do feto, antes do procedimento de interrupção da gravidez, por meio da administração de drogas. Já morto, ele é retirado do corpo da mulher.
“É vedada ao médico a realização do procedimento de assistolia fetal, ato médico que ocasiona o feticídio, previamente aos procedimentos de interrupção da gravidez nos casos de aborto previsto em lei, ou seja, feto oriundo de estupro, quando houver probabilidade de sobrevida do feto em idade gestacional acima de 22 semanas”, destaca o CFM.
Atualmente, pela literatura médica, um feto com 25 semanas de gestação e peso de 500 gramas é considerado viável para sobreviver a uma vida extrauterina. No período de 23 a 24 semanas, pode haver sobrevivência.
O conselheiro do CFM e relator da resolução, Raphael Câmara, ressaltou que, a partir da 22ª semana de gestação, há possibilidade de vida extrauterina, e a realização da assistolia fetal pelo profissional nesses casos, portanto, não teria previsão legal.
Câmara disse ainda que o Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao profissional praticar ou indicar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação vigente no Brasil. “Estamos falando de fetos viáveis. Fetos de sete, oito, nove meses.”
Segundo o conselheiro, o CFM não se opõe a casos de aborto previstos em lei, uma vez que a resolução trata apenas da proibição da assistolia fetal a partir da 22ª semana de gestação.
Ele defende que o texto não tira o direito de mulheres vítimas de estupro de se submeterem ao aborto garantido por lei nesse tipo de circunstância.
“Não estamos tirando o direito da mulher de se livrar daquela gravidez indesejada”, disse. “A mulher não é obrigada a ficar com aquele fruto indesejável do estupro”, completou.
De acordo com ele, após 22 semanas, os casos não configurariam mais aborto, mas antecipação de parto.
“A mulher [vítima de estupro] vai poder fazer isso a qualquer momento”, destacou Câmara em entrevista coletiva nesta quinta (04), referindo-se à antecipação do parto e citando como procedimentos possíveis a indução do parto vaginal ou a cesárea.
Para o CFM, ultrapassado o marco temporal das 22 semanas de gestação, deve-se preservar o direito da gestante vítima de estupro à interrupção da gravidez e o direito do nascituro à vida por meio do parto prematuro, “devendo ser assegurada toda tecnologia médica disponível para sua sobrevivência após o nascimento”.
Câmara avalia que cabe ao Estado a aplicação de opções estabelecidas em lei de tutela e acolhimento para garantir que não haja contato indesejado, evitando, assim, o agravamento do sofrimento materno e preservando a vida extrauterina do recém-nascido.
Questionado se a resolução abarca os demais casos de aborto legal previstos no Brasil, como quando há risco de vida para a gestante e fetos com anencefalia, o conselheiro explica que o texto se aplica apenas a casos de gravidez oriunda de estupro.