Entre nos nossos canais do Telegram e WhatsApp para notícias em primeira mão.
Telegram: [link do Telegram]
WhatsApp: [link do WhatsApp]
A chuva intensa que atingiu a Espanha nesta semana causou transformações drásticas nas ruas, que se tornaram verdadeiros rios, resultando na morte de mais de 200 pessoas e deixando um rastro de destruição. No início de outubro, o furacão Milton provocou evacuações em cidades inteiras nos Estados Unidos, enquanto parte do deserto do Saara, na África, ficou alagada. Em abril, mais de 180 vidas foram perdidas no Rio Grande do Sul devido a temporais.
A intensificação das chuvas não é mera impressão; segundo especialistas, esses fenômenos climáticos estão interligados pelo aquecimento dos oceanos. O ano de 2023 foi o mais quente da história, e 2024 já segue essa tendência preocupante. As temperaturas poderiam ser ainda mais elevadas se não fosse a capacidade dos oceanos de reter cerca de 90% do calor gerado na atmosfera pelo aumento das emissões de gases de efeito estufa. Essa retenção resulta em águas mais quentes, que, por sua vez, geram um aumento na umidade e, consequentemente, chuvas mais volumosas.
Regina Rodrigues, especialista da Organização Meteorológica Mundial (OMM) em pesquisas sobre o Atlântico e suas ondas de calor, afirma que a ação dos oceanos na contenção do calor na atmosfera está elevando significativamente suas temperaturas, impactando as condições atmosféricas. Ela alerta que, se essa situação persistir, poderemos enfrentar uma série de catástrofes climáticas.
Para entender por que os oceanos transformam chuvas em desastres, é fundamental analisar como estão esquentando. O aumento das concentrações de gases de efeito estufa gerados por atividades humanas tem contribuído para o aquecimento global. Em 2023, a Organização das Nações Unidas (ONU) revelou que as concentrações de dióxido de carbono (CO2), o gás de efeito estufa mais abundante, ultrapassaram os níveis da era pré-industrial em 151%, atingindo um pico de 420 partes por milhão.
Com mais CO2 na atmosfera, o planeta aquece mais do que o normal, e os oceanos atuam como reservatórios de calor, absorvendo o excesso de temperatura. Esse calor é liberado na forma de umidade, mas a absorção crescente de calor acelera esse processo, intensificando a umidade na atmosfera e tornando as chuvas mais fortes. Regina Rodrigues explica que a evaporação do oceano, ao ser intensificada pelo calor, aumenta a quantidade de água disponível na atmosfera, o que leva a chuvas mais intensas.
De acordo com a OMM, a cada aumento de 1°C na temperatura, o ar pode conter em média 7% a mais de vapor de água, elevando o risco de desastres. Recentes eventos climáticos são reflexos diretos das mudanças climáticas. No caso de Valência, na Espanha, um estudo da World Weather Attribution (WWA) aponta que as temperaturas do Atlântico, que forneceram umidade para a tempestade, são de 50 a 300 vezes mais prováveis devido às mudanças climáticas. A cidade enfrentou chuvas torrenciais que em poucas horas trouxeram o equivalente ao volume de chuva esperado para um ano.
Esse evento foi causado por uma “depressão isolada em altos níveis”, fenômeno comum que ocorre quando uma massa de ar frio encontra ar quente e úmido próximo ao solo, resultando em chuvas intensas. O aquecimento no Atlântico Norte foi um fator determinante, já que um canal de umidade conhecido como “rio voador” transportou umidade para a atmosfera, combinando-se com o Mar Mediterrâneo, também aquecido, gerando uma quantidade imensa de precipitação.
A OMM já relaciona a intensidade do fenômeno DANA, que afetou Valência, ao aquecimento dos oceanos. O ar quente próximo à superfície, carregado de umidade do Mediterrâneo, combinado com a instabilidade gerada pelo encontro com ar frio na atmosfera superior, resultou em nuvens convectivas que provocaram chuvas torrenciais e inundações repentinas. Regina Rodrigues destaca que o canal de umidade que impactou a Espanha também causou inundações no Saara, onde foram registrados bolsões de água, algo inédito.
O furacão Milton também é um exemplo de fenômeno exacerbado pelo aquecimento dos oceanos, subindo rapidamente de categoria e tornando-se uma ameaça em várias regiões dos Estados Unidos em menos de 12 horas. A WWA analisou a intensificação do furacão, indicando que a passagem por águas do Golfo do México, aquecidas acima da média, contribuiu para sua rápida escalada a uma categoria 5, com ventos de 290 km/h.
Da mesma forma, o desastre no Rio Grande do Sul, que resultou em mais de 180 mortes, está vinculado ao aquecimento das águas oceânicas. Durante um período de instabilidade causado por uma corrente de vento intensa, a região recebeu umidade de um “rio voador”. A quantidade de umidade foi um reflexo das águas aquecidas, e a combinação com o calor atmosférico resultou em um temporal sem precedentes.
Fábio Luengo, meteorologista, explica que oceanos mais quentes geram mais energia para a formação de chuvas, levando a eventos climáticos extremos. Especialistas têm alertado sobre o aumento das temperaturas e a necessidade urgente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O Brasil, atualmente, emite cerca de 2,3 bilhões de toneladas de gases, posicionando-se como o sexto maior emissor do mundo.
Regina Rodrigues enfatiza que, além dos desastres em sequência, existe uma vulnerabilidade crescente a esses eventos, uma vez que os sistemas de previsão não conseguem antecipar tais intensidades, colocando em risco a população, que pode não ser avisada a tempo. A previsão se torna mais imprevisível, aumentando o risco de mortes e tragédias.