O Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) concluiu que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial em seu julgamento dos processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no âmbito da Operação Lava Jato.
A maioria do comitê deliberou que quatro artigos do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos foram violados no caso em questão: direito à liberdade (artigo 9); julgamento justo perante um tribunal imparcial e independente, e presunção de inocência (artigo 14); proteção da privacidade (artigo 17); e garantia dos direitos políticos (artigo 25).
“Embora os Estados tenham o dever de investigar e processar os atos de corrupção e manter a população informada, especialmente em relação a um ex-chefe de Estado, tais ações devem ser conduzidas de forma justa e respeitar as garantias do devido processo legal”, declarou o membro do Comitê Arif Bulkan.
Na decisão divulgada na quinta-feira (28) pelo comitê da ONU, há um anexo que mostra as razões pelas quais o procurador português José Manuel Santos Pais e a juíza togolesa Kobauyah Tchamdja Kpatcha, membros do comitê, divergiram da decisão final.
Eles discordaram de praticamente todas as acusações do petista, por exemplo, a de que teria sofrido “privação de liberdade”, em 2016, quando foi submetido a uma condução coercitiva para depor numa sala do aeroporto de Congonhas. Pais e Kpatcha também não acataram uma parte da denúncia segundo a qual a interceptação telefônica e a divulgação das conversas de Lula, naquele mesmo ano, teriam por objetivo “humilhar e intimidar”.
O comitê concluiu que “a conduta e outros atos públicos do então juiz Moro violaram o direito de Lula a ser julgado por um tribunal imparcial; e que as ações e declarações públicas do ex-juiz Moro e dos procuradores violaram o direito de Lula à presunção de inocência”.
As recentes vitórias de Lula na Justiça levaram o PT a usar politicamente as decisões e a divulgar que o petista foi “inocentado” em ações que não tiveram o mérito julgado.
Nos últimos anos, após derrotas jurídicas que lhe custaram 580 dias de prisão, o petista respondeu a 20 ações. Em apenas três situações houve, de fato, a absolvição. Outros 16 casos foram interrompidos por questões processuais ou reviravoltas que levaram ao arquivamento das ações.
Ricardo Lewandowski suspendeu a única ação penal ainda ativa contra o ex-presidente, que tramitava em Brasília, da Operação Zelotes.
Com o arquivamento de acusações e a declaração de prescrição de casos, hoje é improvável que Lula volte a ser condenado criminalmente na Lava Jato e operações relacionadas.
Vale destacar aqui uma avaliação do professor de Direito Penal da FGV-Direito Rio Felipe Lima Almeida, em setembro de 2021 ao jornal o Estado de S. Paulo.
“A expressão ‘inocente’ não é técnico-jurídica. Inocentes todos nós somos até que se tenha uma sentença condenatória transitada em julgado, e realmente isso não existe em relação ao ex-presidente Lula”, disse o professor. “Agora, trancamento de ação penal, arquivamento de inquérito ou rejeição de denúncia, nessas situações nós não temos o enfrentamento do mérito, então não há sentença do Estado dizendo que não houve crime.”
Portanto, não, o Comitê da ONU não disse que Lula é inocente, e muito menos o Supremo Tribunal Federal o inocentou.