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O governo de Mato Grosso sancionou uma nova lei que incorpora o conceito de “boi bombeiro” em áreas de proteção permanente (APP) para auxiliar no combate aos incêndios no Pantanal, um dos biomas mais afetados pelas queimadas.
A Lei 12.653 de 2024, publicada no Diário Oficial do estado na última sexta-feira (24), autoriza o uso da pecuária extensiva e práticas de roçada com o intuito de reduzir a biomassa vegetal combustível e os riscos de incêndios florestais.
A nova legislação surgiu após negociações com o Ministério Público de Mato Grosso (MPMT), que solicitou alterações em uma lei anterior (11.861 de 2022), que enfrentava uma ação direta de inconstitucionalidade. Embora a pecuária extensiva já fosse permitida em áreas de pastagens nativas pela legislação de 2022, não havia previsão para o uso do gado como uma medida de prevenção de incêndios.
O governo de Mato Grosso enfatizou que a prática da pecuária extensiva em APPs é autorizada somente em locais com pastagens nativas. A Secretaria de Meio Ambiente do estado esclareceu que a lei não representa uma liberação irrestrita para a criação de gado no Pantanal, mas visa utilizar a atividade pecuária para criar aceiros naturais que ajudem a conter a propagação dos incêndios, assegurando que as restrições impostas promovam o desenvolvimento sustentável, econômico e social da região.
A tese do “boi bombeiro” ganhou notoriedade em 2020, durante o grande incêndio já registrado no bioma, que devastou cerca de 30% do Pantanal brasileiro. O incêndio de 2024 superou o registrado no mesmo período de 2020, ano recorde de queimadas.
Na época, a então ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo Bolsonaro, Tereza Cristina, defendeu a expansão da pecuária como uma estratégia para reduzir as queimadas, embora essa abordagem enfrente críticas de ambientalistas. A premissa é de que o gado, ao consumir a vegetação, pode amenizar a intensidade dos incêndios.
A promotora Ana Luiza Perperline, do MPMT, que participou da ação de inconstitucionalidade contra a lei anterior, avaliou que a nova legislação representa um avanço por eliminar a possibilidade de uso de APPs para pecuária extensiva.
Segundo ela, a norma anterior permitia o acesso do gado a essas áreas, enquanto a nova lei restringe essa permissão, permitindo apenas o acesso para obtenção de água, uma vez que é difícil limitar o gado em busca de água, especialmente em áreas de pastagens nativas.
Perperline afirmou que as modificações na lei solucionaram as inconstitucionalidades apontadas pelo Ministério Público, ressaltando que a lei anterior permitia atividades não autorizadas na reserva legal, a não ser mediante manejo florestal sustentável.
Estudos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também defendem a tese do “boi bombeiro”, e o governo de Mato Grosso alega que a permissão para a pecuária sustentável é respaldada por mais de 50 anos de pesquisa da Embrapa Pantanal.
Entretanto, especialistas e ambientalistas contestam essa ideia. Um levantamento de 2020 realizado pelo professor Ubirajara Oliveira, do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), revelou que as áreas com maior quantidade de gado no Pantanal concentravam também o maior número de focos de incêndios.
O biólogo Gustavo Figueroa, diretor do Instituto SOS Pantanal, reconhece que há um fundo de verdade na tese, mas ressalta que sua eficácia é relativa. Ele observou que, em algumas situações e locais, a presença do gado pode reduzir a matéria orgânica, mas não se pode esperar que a introdução de gado em todas as áreas vá reduzir os incêndios, citando que várias fazendas com atividade pecuária também foram consumidas pelo fogo.