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O incidente em Goiânia, em setembro de 1987, causou o maior acidente radiológico da história do Brasil, sem envolver uma guerra. Catadores de material reciclável encontraram uma peça de metal em um terreno abandonado onde funcionava o Instituto Goiano de Radioterapia. Ao desmontá-la, acreditando que teria valor financeiro, venderam a peça para um ferro-velho, sem saber que se tratava de uma fonte de césio-137, utilizada em tratamentos de câncer. Quando a blindagem foi violada, a radiação se espalhou, afetando pessoas na cidade.
Os primeiros pacientes apresentaram sintomas semelhantes aos de exposição à radiação, mas os médicos não conseguiam diagnosticar a origem do problema. Foi apenas após uma semana que a esposa do dono do ferro-velho, desconfiada dos efeitos do material, o entregou à Vigilância Sanitária. O físico Walter Mendes, ao inspecionar o local, confirmou a presença de radiação intensa, o que levou à adoção de medidas de emergência, como o isolamento das áreas afetadas e a criação de um centro de triagem no Estádio Olímpico. Durante os três meses seguintes, cerca de 112.800 pessoas foram monitoradas.
Os pacientes mais graves foram levados para o Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio de Janeiro, onde receberam tratamento especializado. Segundo Mendes, o tratamento foi um trabalho de referência mundial, pois as pessoas que haviam absorvido radiação internamente, mas não apresentavam contaminação externa, puderam ser tratadas com sucesso. Dezesseis dessas pessoas retornaram a Goiânia e estão vivas graças ao tratamento recebido.
O Hospital Naval Marcílio Dias já possuía uma enfermaria de pacientes irradiados desde um convênio de 1981 com a Furnas Centrais Elétricas, responsável pela construção da usina nuclear Angra I. A capacitação de profissionais na área de radioproteção teve início ainda na década de 1970, e a estrutura hospitalar, com grande porte e capacidade de mobilizar rapidamente equipes multidisciplinares, foi fundamental para o sucesso do atendimento. O Capitão de Mar e Guerra (Apoio à Saúde) Sonia Fonseca Rocha lembra com clareza dos primeiros pacientes recebidos no aeroporto do Rio de Janeiro, e destaca que, com a formação recebida, a equipe conseguiu evitar qualquer contaminação interna.
Desde o acidente, a Marinha do Brasil manteve o convênio com a Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, em Angra dos Reis, e realiza exercícios anuais para testar a resposta médico-hospitalar. O Serviço de Medicina Nuclear do Hospital Naval evoluiu, incorporando novas tecnologias, como tomografia computadorizada de alta precisão, usadas no diagnóstico de doenças complexas nas áreas de oncologia, cardiologia e neurologia. A enfermaria que recebeu os pacientes mais graves se transformou em uma Unidade de Tratamento Intensivo para Radioacidentados, equipada com leitos, centro cirúrgico e laboratório, funcionando de acordo com as normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).
O Brasil, hoje, está mais preparado para lidar com situações semelhantes. Walter Mendes destaca que, embora o plano de emergência original fosse para a central nuclear Angra I, hoje existe um plano mais sofisticado, capaz de lidar com acidentes em áreas urbanas.