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Palavra do Ano de 2024: “Brain Rot” ou “Cérebro Roto”
A Palavra do Ano de 2024 é “brain rot”, que em português significa “cérebro podre”, de acordo com a votação organizada pela editora da Universidade de Oxford, no Reino Unido.
O dicionário Oxford define o termo como “o suposto deterioramento do estado mental ou intelectual de uma pessoa, especialmente visto como resultado do consumo excessivo de material (agora particularmente conteúdo online) considerado trivial ou pouco desafiador”.
A editora organizou a votação e envolveu mais de 37.000 pessoas. O termo “cérebro podre” foi o favorito.
De acordo com Casper Grathwohl, presidente da Oxford Languages, “a palavra captura um dos perigos percebidos da vida virtual e de como estamos utilizando nosso tempo livre. Não é surpreendente que tantos votantes tenham abraçado o termo, apoiando-o como nossa escolha deste ano”.
Grathwohl também destacou como os jovens, principais criadores e consumidores do conteúdo digital que gera o “cérebro podre”, adotaram o termo com um tom autocrítico.
Eles mostram uma combinação de consciência e humor que ampliou o uso global do termo, ressaltando a crescente influência das comunidades online no moldar da linguagem contemporânea.
Consultado pela Infobae, o pesquisador em medicina do Conicet e do Serviço de Medicina Familiar e Comunitária do Hospital Italiano de Buenos Aires, Sergio Terrasa, comentou que se trata de um termo cada vez mais utilizado. Com base em estudos publicados até o momento, “há uma clara associação estatística entre o tempo de uso de dispositivos digitais e certos sintomas relacionados à saúde mental”.
No entanto, “isso não implica que exista um efeito causal, pois uma pessoa pode ter uma vulnerabilidade prévia. Essa vulnerabilidade pode fazer com que a pessoa passe mais tempo nas redes sociais, e não o contrário. Por isso, seria prudente evitar afirmar que o consumo de conteúdos digitais ‘rompe’ ou ‘deteriora’ o cérebro”.
Quando o termo começou a ser usado
Embora “cérebro podre” tenha ganhado notoriedade recentemente, suas raízes remontam ao século XIX. O primeiro uso registrado do termo aparece em 1854 na obra Walden, de Henry David Thoreau. Foi um ensaio no qual o autor reflete sobre a vida simples em contato com a natureza.
Thoreau utilizou a expressão para criticar a tendência social de desvalorizar ideias profundas em favor de conceitos mais simples: “Enquanto a Inglaterra se esforça para curar a podridão das batatas, não se esforçará ninguém para curar a podridão mental (brain rot), que prevalece de forma muito mais ampla e com consequências mais fatais?”, escreveu.
Se naquela época Thoreau questionava o abandono do pensamento complexo, hoje “cérebro podre” é usado para sinalizar o impacto do conteúdo superficial no ambiente virtual.
O termo ainda não é utilizado em estudos científicos nem reconhecido como um transtorno mental, mas há trabalhos publicados que alertam sobre os impactos negativos do uso excessivo das telas de celulares, tablets e computadores.
Existem plataformas digitais como o TikTok, que estão mais associadas a vídeos virais, memes curtos e outros materiais criados para entreter mais do que para estimular o pensamento crítico.
O que a ciência diz sobre o “cérebro podre”
Embora a expressão não seja mencionada explicitamente, existem evidências que associam o uso das telas a mudanças na saúde mental.
Em outubro passado, a revista BMC Public Health publicou uma análise prospectiva sobre o cérebro dos adolescentes e o tempo que passam em frente às telas. O estudo foi conduzido por Jason M. Nagata, da Universidade da Califórnia, em San Francisco, EUA.
Foi identificada uma associação entre maior tempo em frente às telas e sintomas descritos no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: sintomas depressivos, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), queixas físicas como dor ou desconforto e transtorno oposicional desafiador.
O tipo de uso de telas mais vinculado a sintomas depressivos incluiu o uso de redes sociais, videogames, vídeos de streaming e aplicativos de mensagens. A equipe analisou dados de 9.538 adolescentes de 9 a 10 anos (no início do estudo), com acompanhamento durante dois anos (2016-2020).
Em abril passado, pesquisadores do Instituto Universitário de Neurociência e do Departamento de Psicologia Clínica, Psicobiologia e Metodologia da Universidade de La Laguna, na Espanha, publicaram um estudo sobre a relação entre o uso de celulares e internet e os efeitos no controle cognitivo.
Como informou a Infobae, o estudo encontrou que tanto a adição à internet quanto a adição a smartphones alteram o controle cognitivo e afetam o sistema de recompensa no cérebro de adolescentes e jovens adultos. Os principais efeitos identificados no trabalho publicado na revista Neuroscience & Biobehavioral Reviews incluem:
- Alterações no sistema de recompensa: Foram registradas disfunções em regiões cerebrais como o estriado, a amígdala, a ínsula e a córtex cingulada anterior, afetando a sensibilidade ao prazer e à punição.
- Deterioração do controle executivo: Mudanças em áreas relacionadas com funções executivas, como o córtex pré-frontal dorsolateral, o lóbulo parietal e outras regiões pré-frontais, o que reduz a capacidade de tomar decisões e controlar impulsos.
- Conectividade funcional anormal: Identificaram-se padrões alterados de conectividade entre regiões implicadas na regulação emocional, controle de impulsos e tomada de decisões.
Para chegar a esses resultados, foi feita uma revisão sistemática de pesquisas publicadas entre 2013 e 2023 que utilizaram imagens de ressonância magnética funcional. “A deterioração do controle executivo em adolescentes e jovens adultos pode predispor para decisões impulsivas, afetando seu desenvolvimento psicológico e social”, mencionaram.
Eles também ressaltaram: “É crucial implementar programas educativos que incentivem o uso mais saudável da tecnologia para mitigar essas alterações cognitivas e emocionais.”
Em resumo, o termo “cérebro roto” reflete uma preocupação crescente com o impacto do mundo digital na saúde mental. Embora mais pesquisas sejam necessárias para entender completamente as complexidades dessa relação, é fundamental que a sociedade promova um uso mais consciente e equilibrado da tecnologia.
