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Em um feito histórico que redefine os limites da exploração espacial tripulada, a missão Fram2 da SpaceX retornou à Terra com sucesso na tarde desta sexta-feira (4), após orbitar o planeta pela primeira vez sobre os polos Norte e Sul. A cápsula Crew Dragon, batizada de Resilience, amerissou no Oceano Pacífico, na costa sul da Califórnia, às 13h19, horário de Brasília (16h19 GMT), com transmissão ao vivo realizada pela SpaceX em seu site. (Vídeo no final da matéria).
Desde o início da era espacial, as missões tripuladas seguiam trajetórias próximas à linha do Equador, uma rota padrão que permitia observar grande parte do planeta, mas com limitações evidentes. A missão Fram2 quebrou essa lógica, abrindo uma nova e promissora janela para o conhecimento científico e a exploração espacial.
Além da inovadora órbita polar, a Fram2 realizou 22 experimentos científicos, incluindo o MushVroom, uma audaciosa tentativa de cultivar fungos em órbita pela primeira vez. Esta foi a 17ª missão tripulada da SpaceX e a sexta realizada para clientes privados, com as outras 11 sendo voos para a Estação Espacial Internacional (ISS) em parceria com a NASA.
Outra novidade marcante foi o local de pouso. Diferentemente das missões anteriores da companhia, que amerissaram na Flórida, a Fram2 foi a primeira a retornar na Costa Oeste. Essa mudança visa minimizar o risco de fragmentos do tronco descartável da Crew Dragon causarem danos ou ferimentos durante a reentrada na atmosfera.
O Início de Uma Aventura Sem Precedentes
A jornada da Fram2 começou às 0h46 GMT do dia 1º de abril, quando um foguete Falcon 9 decolou da plataforma 39A do Centro Espacial Kennedy, impulsionando a cápsula Dragon rumo a uma órbita nunca antes alcançada por humanos. Pouco após o lançamento, o primeiro estágio do foguete pousou com sucesso em um drone autônomo no Atlântico. A cápsula, já em sua trajetória polar, iniciou sua viagem por regiões jamais vistas por uma missão espacial tripulada.
A SpaceX informou que a nave atingiu altitudes entre 425 e 450 quilômetros acima da superfície terrestre. Cada órbita, de Polo Norte a Polo Sul, levava apenas 46 minutos, proporcionando uma cobertura visual e científica sem precedentes, com foco especial nas zonas polares e em fenômenos atmosféricos de difícil acesso por outras rotas. “Durante sua missão de vários dias, a Dragon e sua tripulação explorarão a Terra a partir de uma órbita polar e sobrevoarão as regiões polares terrestres pela primeira vez”, detalhou a empresa antes da partida.
O nome Fram2 não foi escolhido por acaso. Ele homenageia o histórico navio polar Fram, pioneiro nas explorações do Ártico e da Antártida no final do século XIX. Além disso, “Fram” significa “adiante” em norueguês, resumindo o espírito que impulsionou esta missão: avançar nas fronteiras do conhecimento, explorar o desconhecido e romper com o estabelecido.
Tripulação Inovadora para uma Missão de Fronteira
A inovação da Fram2 não se limitou à sua trajetória. A tripulação também foi um diferencial. Nenhum dos quatro integrantes era astronauta profissional. O comandante foi Chun Wang, um empresário ligado ao mundo das criptomoedas. Ele foi acompanhado por Jannicke Mikkelsen, cineasta norueguesa especializada em tecnologias extremas; Eric Philips, guia australiano de expedições em zonas polares; e Rabea Rogge, pesquisadora alemã especialista em robótica. Essa diversidade de perfis definiu a Fram2 como uma missão de fronteira não apenas no aspecto técnico, mas também no humano.
Ciência Sem Limites em uma Órbita Inédita
O voo polar apresentou desafios significativos. Ao contrário das órbitas inclinadas tradicionais, alcançar os polos exigiu uma inclinação de 90 graus em relação ao Equador, o que demandou mais combustível, planejamento preciso e manobras ajustadas. A cápsula Dragon seguiu uma trajetória inédita em direção ao sul, cruzando sobre a Flórida e Cuba antes de alcançar sua órbita polar. Essa rota foi escolhida não apenas por suas possibilidades científicas, mas também pelo simbolismo de atravessar áreas nunca observadas de uma cápsula tripulada.
Além do componente tecnológico, a Fram2 funcionou como um laboratório flutuante. Durante os dias em órbita, os tripulantes realizaram 22 experimentos destinados a melhorar a saúde humana no espaço e a compreender os efeitos fisiológicos da microgravidade. Um dos destaques foi a primeira radiografia realizada no espaço. “Este será o primeiro intento de captar imagens radiográficas em órbita, tanto do corpo humano quanto de equipamento essencial”, indicou a informação oficial da missão. A possibilidade de diagnosticar lesões ou doenças em pleno voo representa um avanço significativo para viagens espaciais de longa duração, como as planejadas para Marte.
Outros estudos exploraram a regulação da glicose no corpo humano em microgravidade e analisaram métodos para exercícios em espaços reduzidos, já que a Dragon possuía apenas quatro metros de largura. A manutenção da massa muscular e óssea foi uma prioridade médica, e a tripulação utilizou novas ferramentas para contrabalancear os efeitos da microgravidade sem a necessidade de estruturas complexas.
Em paralelo, foi realizado um teste de agricultura espacial, com a primeira tentativa de cultivar cogumelos ostra em microgravidade. O experimento obteve avanços que podem pavimentar o caminho para a produção de alimentos frescos em missões de longa duração, um elemento crucial para a autossuficiência no espaço.
As observações atmosféricas também tiveram um papel central na missão. Com a ajuda da cúpula panorâmica instalada na cápsula, uma estrutura de vidro de 1,2 metros de largura, foram documentadas auroras boreais e austrais. A missão buscou especialmente capturar imagens de STEVE (Strong Thermal Emission Velocity Enhancement), um fenômeno de emissão térmica que aparece como fitas de luz púrpura ou verde em grande altitude. Este tipo de aurora, descoberto relativamente há pouco tempo, pode oferecer novas informações sobre a interação entre o campo magnético terrestre e as partículas do Sol.
Com esta nova etapa, a SpaceX fortalece sua liderança no setor espacial privado e levanta questões fundamentais sobre o futuro da exploração. Até onde uma missão civil pode chegar? Qual será o papel de cidadãos comuns na construção do conhecimento fora do planeta? Como a vida humana será redesenhada em ambientes extraterrestres?
A Fram2 não respondeu a todas essas perguntas de imediato, mas ofereceu as ferramentas para começar a construir essas respostas. Com cada órbita, cada imagem e cada experimento, a missão deixou uma marca no caminho rumo a um futuro onde o espaço não será apenas domínio de agências estatais, mas um terreno compartilhado entre ciência, inovação e aventura.
