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“Centenas de policiais estão à nossa porta”, declarou Ekrem Imamoglu em uma mensagem de vídeo aos seus apoiadores em 19 de março, falando ao telefone. “Enfrentamos a tirania, mas não me desanimarei.” O prefeito de Istambul, e provável candidato da oposição turca às próximas eleições presidenciais, se preparava para sair de seu apartamento. Momentos depois, foi preso. Seu partido classifica a ação como uma tentativa de golpe de Estado por parte do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan.
De acordo com o The Economist, no mesmo dia, mandados de prisão foram emitidos contra outras 105 pessoas, incluindo assessores de Imamoglu, funcionários municipais de seu Partido Republicano do Povo (CHP) e um proeminente jornalista. Com a divulgação da notícia, estradas que levavam à delegacia onde Imamoglu estava detido foram bloqueadas. As autoridades também restringiram o acesso às redes sociais e fecharam estações de metrô. Em nome da salvaguarda da “ordem pública”, o governador de Istambul anunciou a proibição de reuniões públicas por quatro dias. Milhares de manifestantes desafiaram a ordem naquela mesma noite e se reuniram em frente ao gabinete do prefeito.
A promotoria turca parece estar seguindo uma velha fórmula soviética com Imamoglu: “Mostre-me o homem e eu encontrarei o crime”. Nos últimos três anos, ele foi investigado por uma série de acusações, desde corrupção até insultos a funcionários eleitorais que tentaram privá-lo de sua vitória nas eleições municipais de 2019. As acusações incluem liderar uma organização criminosa, instigar um grupo terrorista, suborno e manipulação de licitações para obras governamentais.
O momento da prisão de Imamoglu não parece ser casual. Em um congresso do partido agendado para 23 de março, esperava-se que o CHP o indicasse como seu candidato presidencial para as eleições de 2028, mas que se espera que sejam realizadas antes. Imamoglu ajudou a liderar a oposição a uma vitória impactante nas eleições locais do ano passado, infligindo a Erdogan e seu partido governante, Justiça e Desenvolvimento (AK), sua primeira derrota em mais de duas décadas. Desde então, ele desfruta de uma vantagem confortável sobre o líder da Turquia nas pesquisas.
O governo aparentemente não queria deixar nada ao acaso. Um dia antes de sua prisão, as autoridades revogaram o diploma universitário de Imamoglu. Na Turquia, os candidatos à presidência devem ser graduados universitários por lei.
Funcionários de Erdogan se mostraram consternados com a ideia de que ele estaria usando os tribunais como arma. “Associar as investigações e os casos judiciais ao nosso presidente é, no mínimo, audacioso e irresponsável”, anunciou o ministro da Justiça do país, Yilmaz Tunc, logo após a prisão do prefeito. “O poder judiciário não acata as ordens de ninguém.”
Muitos turcos esperavam que Imamoglu enfrentasse mais julgamentos, mas poucos pensaram que ele seria preso. “Mesmo para os padrões de Erdogan, este é um passo enorme”, afirma Gonul Tol, do Middle East Institute, um centro de estudos americano. Erdogan pode pensar que a presidência de Donald Trump lhe concede impunidade. “Trump criou um caos tal”, afirma Tol, “que os autocratas estrangeiros [sentem] que podem fazer o que quiserem.”
O panorama para a já enfraquecida democracia turca parece sombrio. Mansur Yavas, prefeito de Ancara e também considerado um possível aspirante à presidência, sugeriu que poderia ter o mesmo destino de Imamoglu. “A Turquia está evoluindo para um modelo onde a competição política é praticamente impossível”, afirma o analista Ibrahim Uslu.
A prisão do prefeito de Istambul é a maior de seu tipo, mas não é a primeira nem provavelmente será a última. Nos últimos dois meses, ocorreram prisões de vários prefeitos da oposição e jornalistas que cobriam uma investigação sobre Imamoglu. Quando dois altos funcionários da principal associação empresarial da Turquia denunciaram a repressão, também foram intimados a depor. Eles enfrentam até cinco anos de prisão.
Ao perseguir seu principal rival, Erdogan pode estar tentando destruir a aliança entre o CHP e o principal partido curdo da Turquia, o Partido para a Igualdade e a Democracia dos Povos (DEM). A prisão de Imamoglu coloca o DEM, que viu dezenas de seus próprios políticos presos na última década, em uma situação difícil. O partido espera que Erdogan responda ao chamado de cessar-fogo feito por Abdullah Öcalan, o líder preso de um grupo armado curdo, com concessões à minoria curda do país.
O homem forte da Turquia pode agora fazer ao DEM uma oferta irresistível: manter o silêncio ou ver o processo de paz se esfacelar. “O DEM tem muito a perder enquanto continuam as conversas com Öcalan”, afirma Sinem Adar, do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança, “portanto, sua reação será inevitavelmente limitada.”
Os mercados, um dos poucos freios ao poder de Erdogan, se mostraram menos moderados. A lira turca, que se recuperou nos últimos dois anos graças à austeridade e aos aumentos das taxas de juros, caiu mais de 12% em relação ao dólar poucas horas após a prisão de Imamoglu, antes de reduzir suas perdas. Segundo relatos, o banco central da Turquia gastou US$ 10 bilhões em reservas estrangeiras para sustentar a moeda. O principal índice do mercado de ações turco caiu 8,7% naquele dia, causando interrupções nas negociações.
Em um gesto de desafio, o CHP anunciou que realizaria seu congresso em 23 de março. Convidou todos os turcos, não apenas membros do partido, a comparecer e escolher Imamoglu como seu candidato. “O que estamos enfrentando”, declarou Ozgur Ozel, líder do CHP, aos manifestantes, “é uma tentativa de golpe de Estado.”
